segunda-feira, 8 de março de 2010

De como o cadáver é aquilo que se procura.

ela embonecou mais ainda a boneca que tinha o mesmo rosto daquela atriz famosa.
ela andou pelo quarto, procurou algo mais.
sentiu um frio na barriga ao pensar que era o fim.
abriu as janelas.
mas antes cortou as cortinas vermelhas que estavam lá desde antes de ela nascer.
o quarto havia sido preparado pelos pais.
esperavam que ela fosse gerar grandes felicidades para eles.
e ela o fez.
fez de tudo.
menos ser feliz para ela mesma.
abriu as janelas.
o vento entrou.
bateu nos cabelos loiros da boneca.
sentada na cama.
morta e cheia de maquiagem, a sorridente face de porcelana nem se mexeu com o vento frio.
ela andou mais um pouco.
olhou para a boneca mais uma vez.
10 andares até lá embaixo.
olhos azuis de boneca atriz.
cabeça levantada.
pé esquerdo primeiro.
cabelos loiros balançavam ao sabor do vento e a face pálida continuava estática.
pé direito.
sentada.
vento.
rosto pálido.
sorriso falso.
boneca embonecada.
mulher de 40 anos se jogou do 10º andar ontem.
deixou para trás filhos.
ex-marido.
e uma boneca com rosto de atriz e cabelos loiros.
um dia aquilo foi uma meta.
"papai, um dia quero ser como aquela boneca".
palidez.
velório.
velas brancas.
olhos azuis.
fechados.