Seu zumbido encarou meus olhos. Seus
olhos grandes panorâmicos encararam minhas orelhas. Suas asas bateram ainda por
alguns microssegundos, até pararem e suas patas descansarem sobre a parede
branca, imunda. A tela verde da janela não impediu que ela entrasse. Nada impediria
que ela estivesse ali. Meu quarto era dela também. As asas voltaram a bater. Apaguei
minha lâmpada. Ela cessou o voo.
Fechei os olhos e dormi, com ela
ali no quarto, em algum canto escuro. Próximo aos livros, talvez. Amanheceu. Olho
para as paredes a procura dela. Lá está. Imóvel. Na parede imunda. Parece até
uma das tantas manchas em formato singular que aparecem sem querer e que nos lembram
de algo. Ela não me lembra de algo. Ela é algo. Foi seu último voo. Ela veio
até meu quarto pra morrer. Parada. Rígida. Na minha parede.
Sem mais voos. Sem mais zumbidos.
Sem mais olhos e sons que se misturam. Eu a tomo pelas asas semitransparentes. Essas
redes finas que a faziam ir e vir. Que a trouxeram até aqui. Seu corpo comprido
cabe na palma das minhas mãos. Dou meia volta. Saio pela porta do quarto. No meu
caminho algumas chuvas de papel picado invisíveis. Algumas homenagens prestadas
por formigas. Mais paredes sujas. No som toca alguma marcha fúnebre inaudível. Chego
à janela da sala. Nela não há tela verde. Os insetos lá fora zumbem, cantam e
buzinam. Sons de pneus. Árvores um pouco distantes. Ponho minhas mãos pra fora.
Abro-as. O corpo dela flutua. O túmulo dela é feito de ar, até que ela se
choque ao chão e seja engolida pela terra ou pelos seus irmãos insetos. Descanse
em paz, jacinta.
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