segunda-feira, 9 de agosto de 2010

fabuloso arrependimento

o arrependimento cravara mais uma vez os dentes no pescoço do jovem análogo a um artista de cinema dos anos 20, meio cheio de pó de arroz na cara. mas a cara dele era assim mesmo. o verme passou a sugar seu sangue e com o sangue as poucas lembranças boas que lhe restavam de uma anterior que já há muito tinha se dissipado. vida anterior ou vida interior? por que talvez nada daquelas lembranças tenha realmente acontecido. lembranças como beijos em jovens bonitas. jogos de futebol com os amigos. cinema com a segunda namorada (já que a primeira odiava cinema; a relação não durou nem três semanas). jantares e almoços alegres. ah o arrependimento.
passou a destroçar sem piedade o bem estar. a arregaçar sem piedade o singelo véu que separava os bons dos maus momentos naquela vida tão inútil.
chegou com muitos anúncios. ao contrário de muita coisa que se anuncia há muito tempo, porém nunca acontece.
se ele tivesse escolhido outro caminho. se ele tivesse obedecido um pouco mais às regras. aos pais. aos ditames sociais. não. pra quê? ser infeliz sem vontade própria? então agora é infeliz com vontade própria. sem muitas lembranças de tempos bons. aguardando a depressão que acompanha o arrependimento como dois cavaleiros do Apocalipse excluídos pelo texto.
maldita seja aquela hora.
maldito seja aquele minuto.
maldito seja aquele brilho nos olhos que indicavam há vinte anos atrás que ainda havia esperança, quando na verdade a esperança parece ser a única que morre.
por fim fez outra escolha. agarrou-se ao arrependimento com força.
tornou-se misantropo.
esqueceu de tudo.
de bom e de mal.
maldito seja o agora que não deixa escolha e quando pensou já foi.
arrependa-se antes que seja tarde.

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